Quatro “cavalos de Troia” para ficar de olho no texto da Previdência

Quatro “cavalos de Troia” para ficar de olho no texto da Previdência

Lei Complementar, gatilho na idade mínima, capitalização ‘alternativa’ e legislação trabalhista: entenda cada um dos pontos.

A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) da Reforma da Previdência traz, sem alarde, algumas mudanças que pouco têm a ver com o tema principal do projeto. Esse tipo de manobra costuma partir do Congresso. Mas, no governo de Jair Bolsonaro, as jabuticabas surgiram já no texto original entregue à Casa.
Além da impiedade com idosos, deficientes e trabalhadores rurais, o texto traz algumas mudanças que passaram despercebidas nas primeiras leituras. Alterações que parecem pequenas, mas podem ceifar direitos e mudar drasticamente as regras da Previdência.

 

Lei Complementar

Se a PEC foi aprovado como está, várias mudanças futuras importantes ficariam de fora da Constituição. Foi incluído no texto um mecanismo que libera mudanças na idade mínima, cálculo do benefício e tempo de contribuição via Lei Complementar.

Nessa modalidade, são necessários menos votos do Congresso (302 contra 257, em dois turnos) e no Senado (49, em dois turnos contra 41 e um turno só). Um risco aos direitos sociais já conquistados.

 

Gatilho na idade mínima

O texto prevê que, a partir de 2024, a idade mínima seja ajustada a cada quatro anos em até 75% do total do aumento da expectativa de sobrevida (quantos anos uma pessoa vive depois de se aposentar). Fazendo as contas: se essa taxa subir dois anos, a idade mínima crescerá um ano e seis meses.

Para o economista Eduardo Fagnani, essa medida pode levar o país, dentro de poucos anos, a ultrapassar o piso etário de economias de primeiros mundo. “O Brasil é o nono país mais desigual do mundo [dados da Oxfam]. E além de desigual, é heterogêneo. Não dá pra comparar o Piauí com Santa Catarina.”

Caso essa proposta passe pelo Congresso, as mulheres devem ser as grandes prejudicadas, já que vivem mais. Com aumento na idade mínima e a dificuldade de comprovar os vinte anos de contribuição (as mulheres são maioria em empregos informais, e interrompem mais a carreira para cuidar dos filhos), uma massa de trabalhadoras poderá ser lançada aos 400 reais do BPC.

 

Capitalização “alternativa”

A capitalização será apresentada como alternativa aos que começarem a trabalhar depois que a Reforma for aprovada. Em tese, o trabalhador poderia escolher entre a capitalização e o regime geral. Na prática, trata mais de uma imposição.

Não há previsão de que, por exemplo, os patrões tenham que contribuir com a capitalização. Com isso, a tendência é de que as novas vagas ofereçam apenas a capitalização. Além disso, quem optar pelo regime privado não poderá voltar atrás.

No modelo de Paulo Guedes, muito parecido com o do Chile, cada brasileiro ficaria responsável por poupar para a própria velhice. Quem não conseguir, terá assistência social de um salário mínimo. A longo prazo, esse modelo de capitalização acaba com o regime de repartição.

 

Legislação trabalhista

Eis o maior jabuti do texto da Reforma. O texto altera regras da CLT sem passar pelo rito completo, em especial aos aposentados que escolhem continuar trabalhando. As empresas não serão mais obrigadas a recolher o FGTS desses empregados.

Além disso, os demitidos sem justa causa não receberão a multa de 40% do Fundo de Garantia. Uma barreira a menos para demissões, e que pouco tem a ver com o sistema de aposentadorias.

Outra medida que atinge o trabalhador fere especialmente os mais pobres. O pagamento do abono salarial ficará restrito a quem recebe até um salário mínimo. Atualmente, o benefício a concedido aos que ganham até dois mínimos.

 

Por Thais Reis Olveira

Fonte: Carta Capital

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