06 dez Reforma da Previdência: Pensão por Morte e a Dignidade da Pessoa Humana
A Emenda Constitucional nº 103/2019 trouxe mudanças significativas ao
sistema previdenciário brasileiro, impactando diretamente o cálculo e as regras de
concessão da pensão por morte. O presente trabalho tem como objetivo realizar uma
breve análise dessas modificações e questionar em que medida elas afetam a
dignidade da pessoa humana, um princípio fundamental consagrado tanto na
Constituição Federal quanto na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A previdência social é um direito garantido pela Constituição Federal de 1988,
previsto no artigo 194, como parte da seguridade social, que abrange a saúde, a
assistência social e a própria previdência, podendo ser conceituada como um seguro
sob um regime jurídico especial regulado pelas normas de Direito Público. De caráter
contributivo, ela oferece benefícios e serviços aos segurados e seus dependentes,
com variações de acordo com o plano adotado (Amado, 2020).
Com o passar dos anos, o sistema previdenciário brasileiro passou por diversas
reformas, sendo a mais recente a Emenda Constitucional nº 103/2019, que alterou
substancialmente as regras de concessão de aposentadorias e pensões. Essa
emenda, em especial, foi impulsionada pela necessidade de equilibrar as contas
públicas e assegurar a sustentabilidade do sistema previdenciário.
Um dos pontos mais controversos dessa reforma foi a alteração no cálculo da
pensão por morte. Antes da EC 103/2019, a pensão era equivalente à remuneração
integral do segurado falecido, sendo distribuída entre os dependentes. No entanto, a
nova regra prevê uma redução expressiva desse valor, estabelecendo uma cota
familiar de 50% da aposentadoria ou remuneração do segurado, acrescida de 10%
por dependente, até o limite de 100%, conforme artigos 23 e 26 da Emenda
Constitucional nº 103/2019. Isso significa que, na prática, famílias que dependiam
exclusivamente da renda do falecido enfrentarão uma queda substancial em sua
renda mensal.
Essa mudança representa uma ameaça direta à dignidade de muitas famílias,
especialmente quando o instituidor da pensão era o único provedor da casa. Ao
reduzir a renda destinada aos dependentes, a reforma coloca em risco a subsistência
dessas pessoas, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, que está no
cerne da seguridade social (Castro e Lazzari, 2020).
A redução da pensão por morte levanta importantes questões sobre a
responsabilidade do Estado em assegurar que as pessoas não caiam em situações
de indignidade. Embora o objetivo da reforma seja garantir o equilíbrio financeiro e
atuarial do sistema previdenciário, ela não pode ser justificada se o resultado for a
violação de direitos fundamentais (Silva, 2005).
O princípio da dignidade da pessoa humana exige que o Estado ofereça uma
rede mínima de proteção social. No entanto, com as mudanças impostas pela EC
103/2019, muitas famílias podem enfrentar dificuldades extremas para manter um
padrão de vida minimamente adequado após a morte do segurado. Isso gera um
desequilíbrio entre os interesses coletivos de sustentabilidade do sistema e os direitos
individuais dos cidadãos, que contribuíram ao longo de sua vida na expectativa de
proteção futura (Barroso, 2014).
As mudanças trazidas pela reforma previdenciária de 2019, particularmente no
que diz respeito à pensão por morte, têm consequências graves para a vida financeira
das famílias brasileiras. A queda significativa nos valores pagos a título de pensão
afeta diretamente a qualidade de vida e a dignidade de seus dependentes.
Embora a sustentabilidade do sistema seja uma preocupação legítima, é
imperativo que as futuras reformas considerem um equilíbrio entre os interesses
financeiros e a proteção dos direitos fundamentais dos segurados e seus
dependentes, garantindo que ninguém seja deixado sem amparo adequado em um
momento de necessidade.
Referências:
Alves, Hélio Gustavo. 2020. Guia Prático dos Benefícios Previdenciários: De acordo
com a Reforma Previdenciária EC 103/2019. Rio de Janeiro: Forense.
Castro, Carlos Alberto Pereira de, e João Batista Lazzari. 2020. Manual de Direito
Previdenciário: De Acordo com a Reforma Previdenciária EC 103/2019. Rio de
Janeiro: Forense.
Silva, José Afonso da. 2005. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. São
Paulo: Malheiros.
Supremo Tribunal Federal. 2014. Recurso Extraordinário 661.256. Relator: Ministro
Luís Roberto Barroso.